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quinta-feira, novembro 24, 2005

hobbes (1651) explicou os motins de frança

A explicação para a recente vaga de desacatos perpetrados por jovens franceses de ascendência árabe está explicada desde 1651, ano em que Thomas Hobbes escreveu o ‘Leviatã’(...)

Desde então, o filósofo inglês já apontava a esperança – entendida como a convicção de que é possível concretizar um desejo – como uma característica essencialmente humana, justamente aquela que lhe permitia proclamar que os homens são todos iguais.

Para Marques Neto (psicanalista e professor universitário nas áreas do direito e da filosofia) que vem dedicando especial atenção aos depoimentos dos jovens franceses entrevistados pelos media, foi mesmo o sentimento de terem sido espoliados de esperança e de perspectivas de mobilidade social que eles começaram a incendiar automóveis, uns dos mais importantes objectos de desejo da sociedade contemporânea.

Este académico observou que, quando comparados com outros grupos mais desfavorecidos (...) os jovens franceses podiam ser até considerados privilegiados, do ponto de vista material. Mas Marques Neto quis, com esta afirmação, sublinhar apenas que “não basta o essencial” ao ser humano. “A gente quer comida, diversão e arte”, como disse Arnaldo Antunes, um grande poeta (...)

Em qualquer caso, para Marques Neto, resulta evidente de que, tal como os motins de 1992 em Los Angeles, nos Estados Unidos, também a insurreição dos jovens franceses – considerados árabes e africanos na Europa e europeus em África – é uma rebelião “descentrada, desideologizada”, de excluídos. Mas Marques Neto recusa-se a aceitar que a solução para esta exclusão passe pela integração cultural. “Se se integram, deixam de ser o que são”, avisa.

Argumenta que a cidadania pressupõe quer identidades, quer – “talvez mais ainda” – diferenças.

A democracia, defende ainda, mais do que um regime, “é uma ambiência onde é possível a dialéctica, que admite conflitos, ao contrário do totalitarismo”. E conclui que a cidadania, tal como a democracia, “pressupõe a lógica da alteridade, e não da identidade”.

por Álvaro Vieira in Público

sugerido por m.ego

sexta-feira, novembro 11, 2005

como posso ser mais francês?

“As pessoas como eu – descendentes de imigrantes, árabes, negros ou asiáticos – estão a retomar as suas raízes e a adoptar o seu património cultural, exactamente o inverso do que os nossos pais fizeram quando chegaram.

Os meus avós, por exemplo, que vieram da Argélia para viver, trabalhar e construir uma vida melhor, aceitaram o papel de hóspedes. Fizeram tudo o que podiam não só para se integrarem, mas também para se tornarem invisíveis. Chamar as atenções significava, geralmente, problemas – intermináveis controlos policiais de identidade e visto de permanência, comentários e insultos racistas – pelo que evitavam isso. Procuraram, tanto quanto possível, integrar-se e, ao fazerem isso, abandonaram os seus hábitos, língua e cultura.

Claro que não critico a sua opção. Mas as pessoas da minha geração não se envergonham de adoptara a sua cultura e, longe de procurarem a invisibilidade, dispomo-nos a denunciar os preconceitos e as injustiças que enfrentamos.

No meu caso, o Islão é uma parte importante daquilo que sou, tal como ser francês. Ambas as coisas não estão em oposição nem se excluem. Mas quando se ouve o debate, na França actual, diríamos que se excluem.

As pessoas que vivem em bairros como aqueles onde ocorreram os distúrbios iniciados a 27 de Outubro (2005) são tratados como cidadãos de segunda. Temos menos acesso aos direitos e serviços da república, as oportunidades de emprego são remotas. O que temos é um supermercado, um centro comercial para lojas dos 300, alguns restaurantes de comida rápida e talvez um complexo de cinemas. E mais nada. A ideia é criar diversões suficientes para ficarmos onde estamos. A mensagem é: “Não venham misturar-se com as pessoas do centro das cidades.” É o que a polícia diz, quando nos interpela num autocarro para a cidade:”Não têm nada que fazer no centro. Logo não têm motivo para lá ir. Voltem para onde pertencem.”

Antes do 11 de Setembro, diria que era uma espécie de racismo residual. Os problemas das pessoas em relação a nós tinham que ver com a nossa raça, com a cor da nossa pele. Hoje, com muitos jovens que retornam à religião quando iniciam a busca da sua identidade, a fé começa a ser a diferença que mais frequentemente lhes é apontada. Já não sou apenas um negro ou um árabe; sou um muçulmano. E isso é uma palavra de código estranho, alguém que está decidido a não se integrar.

Mas eu nasci e fui criado em França. Sou cidadão francês desde que nasci. Como posso ser mais francês? E há muita gente como eu, não apenas muçulmanos, mas negros e asiáticos.

É tempo dos franceses rejeitarem essas etiquetas antiquadas.

E também é tempo de as minorias rejeitarem o culto da vitimização.

As coisas não são perfeitas. Há muitos problemas. Esses problemas explodiram, libertando o ressentimento há muito reprimido de pessoas que se sentem indesejadas, desprezadas e varridas para o lado como lixo.

Para alterar isso, é preciso preencher a lacuna entre os arrabaldes e o resto da França. Temos de resolver as coisas que nos tornam diferentes. Eu sou francês, sou muçulmano, e há milhões como eu. Vivemos aqui, e não vamos para lado nenhum. Logo, comecemos a habituar-nos a isso.”

Médine (rapper francês, 22 anos, muçulmano. O seu último disco intitula-se ‘Jiade: o maior combate está dentro de ti mesmo’).

in Visão n.º 662, pág. 71

sugerido por m

terça-feira, novembro 08, 2005

no mural da (r)evolução II

Olho por olho o mundo acabará cego!

Mahatma Ghandi

sugerido por m.ego

sábado, novembro 05, 2005

la haine (o ódio)

"Em 1995 o realizador de cinema Mathieu Kassovitz contou-nos a história de Said, Vinz e Hubert, três jovens de uma periferia parisiense que acorda numa manhã em sobressalto devido às torturas sofridas por um jovem de 16 anos num interrogatório policial. A história acaba mal. Agora, morreram dois jovens electrocutados depois de uma acção policial e a pradaria urbana incendiou-se.

Esse belo e trágico filme intitulado O Ódio é uma crónica da permanente guerra civil travada por jovens desintegrados, desempregados e empurrados para a criminalidade com as forças policiais que podia ter sido feita dez anos antes. Ele é apenas mais uma abordagem criativa desta tragédia francesa que antecipa aquilo que um dia pode propagar-se a outros países.


O que está a passar-se em Paris já antes se passou. Paris é um permanente regresso ao passado nesta matéria da violência urbana e também não é por acaso que a França é um dos países europeus onde a extrema-direita fascista maior expressão institucional tem. Há duas décadas que os governos franceses de esquerda e de direita não conseguem dar respostas consequentes na integração das vagas de emigrantes que entraram no país. Há duas décadas que a política francesa oscila entre a defesa e a recusa, ambas radicais, de um modelo social utilizado como arma de arremesso nas barricadas ideológicas de cada tribo. Há duas décadas que a política francesa não sabe como enfrentar o crescimento explosivo do desemprego, da criminalidade, do gigantismo imobiliário em bairros dormitórios, horríveis e labirínticos, que cresceram nas periferias das grandes cidades. Há duas décadas que jovens marginalizados pela crise económica e por uma sociedade em crise de valores estão em guerra com forças policiais abandonadas à sua própria sorte. Uns são a mesma carne do canhão, açulados como cães ao ódio recíproco por um poder político irresponsável(...)" *


"O mesmo sistema de poder que fabrica a pobreza é o que declara guerra sem quartel aos desesperados que gera. Há um século, George Vacher de Lapouge exigia mais guilhotinas para purificar a raça. Este pensador francês, que acreditava que todos os génios são alemães, estava convencido de que só a guilhotina podia corrigir os erros da selecção natural e deter a alarmante proliferação dos ineptos e dos criminosos. «O bom bandido é um bandido morto», dizem, agora, aqueles que exigem uma terapia social de mão pesada(...)

Os problemas sociais reduziram-se a problemas policiais e existe um clamor crescente em favor da pena de morte. É uma pena justa, diz-se, que permite poupar em cadeias, tem um efeito intimidatório e resolve o problema da reincidência suprimindo o possível reincidente. Morrendo, aprende-se a lição.

(…) O poder corta e volta a cortar a erva daninha, mas não pode atacar a raiz sem atentar contra a própria vida. Condena-se o criminoso, mas não a máquina que o fabrica, tal como se condena o toxicodependente mas não o modo de vida que cria a necessidade de consolo químico e a sua ilusão de fuga.

Assim, liberta-se de responsabilidade a ordem social que lança cada vez mais gente para as ruas e para os presídios e que gera cada vez mais desesperança e desespero. A lei é como uma teia de aranha, feita para apanhar moscas e outros pequenos insectos, e não para impedir a passagem dos bichos grandes.

Os delinquentes pobres são os vilões do filme, os delinquentes ricos escrevem o guião e dirigem os actores.”**

* DÂMASO,Eduardo,"O ÓDIO", Diário de Notícias , 4 de Novembro de 2005.
** GALEANO, Eduardo, De pernas para o ar – A escola do mundo às avessas”, Lisboa, Editorial Caminho, 2002,p. 105-106.

sugerido por cão de guarda e por m.ego


sexta-feira, novembro 04, 2005

o controle da internet

"Depois da primeira Cimeira Mundial da Sociedade da Informação que se celebrou em Genebra em dezembro de 2003 [1], cujo tema central tinha sido “a fractura digital”, a pedido da ONU e organizada pela União Internacional de Telecomunicações (UIT), Tunes acolherá de 16 a 18 de novembro a segunda cimeira mundial com uma preocupação central: como instaurar um controle mais democrático na Internet?

A rede de Internet é uma invenção norte-americana da época da Guerra Fria. O Pentágono procurava então elaborar um sistema de comunicação indestrutível, que pudesse resistir a um ataque atómico, e que permitisse aos responsáveis políticos e militares que sobrevivessem retomar o contacto entre eles para lançar o contra­‑ataque. Ainda estudante da Universidade de Los Angeles, Vinton Cerf imaginou e implementou com uma equipa de investigadores financiados com fundos públicos os protocolos e ferramentas de um novo modo revolucionário de comunicação. Mas ainda estava reservado somente a uma pequena minoria de universitários, militares e iniciados.

Mais tarde, em 1989, os físicos Tim Berners-Lee e Robert Cailliau, investigadores do Centro Europeu para a Investigação Nuclear (CERN) de Genebra, puseram em funcionamento um sistema de hipertexto e inventaram a World Wide Web, que favoreceria a difusão das informações e o acesso do grande público à Internet, assim como a sua formidável e fulgurante expansão.

Actualmente e desde 1988, a rede mundial é administrada pela Internet Corporation for Assigned Names and Numbers (ICANN), um organismo de direito privado sem fins de lucro com sede em Los Angeles, submetido à lei californiana e colocado sob o controle do Departamento de Comércio dos Estados Unidos. A ICANN é a grande controladora da rede. Baseia-se num dispositivo técnico constituído por 13 poderosos computadores, denominados “servidores raízes”, instalados nos Estados Unidos (quatro na California e seis perto de Washington), na Europa (Estocolmo e Londres) e no Japão (Tóquiio).

A principal função da ICANN é coordenar os nomes de domínio (Domain Name System, DNS) que ajudam os usuários a navegar pela Internet. Cada computador conectado à Internet possui um endereço único chamado “endereço IP” (de Protocolo Internet). Inicialmente, estes endereços IP são séries de números difíceis de memorizar, mas o DNS permite utilizar em lugar de números letras e palavras mais familiares (o “nome de domínio”). Por exemplo, em lugar de escrever uma série de números, escreve-se
http://www.monde-diplomatique.fr/. O DNS converte o nome de domínio na série de números que corresponde ao endereço IP, o que permite ao seu computador conectar-se com o lugar procurado. O DNS permite também o bom funcionamento do correio electrónico. Tudo isso à escala planetária e a uma velocidade ultra rápida.

De acordo com os seus próprios termos, a missão da ICANN é «preservar a estabilidade operativa da Internet, promover a concorrência, garantir uma representação global das comunicações na Internet, e elaborar uma política correspondente à sua missão de acordo com um procedimento consensual» [2].

Mas, desde há algum tempo, já não há consenso. O domínio dos Estados Unidos sobre a rede mundial vê­‑se cada vez mais impugnado. No passado mês de setembro em Genebra, por motivo de uma negociação prévia entre os Estados Unidos e a União Europeia, antes da cimeira de Tunes, os 25 Estados da União foram unânimes em reclamar uma reforma da governança da Internet aproveitando o vencimento em setembro de 2006 do contrato que vincula a ICANN com o Ministério do Comércio dos Estados Unidos. A reunião saldou­‑se com um fracasso, dado que Washington se negou a toda a mudança.

Por exemplo, o Brasil, a China, a Índia e o Irão encontram­‑se nas mesmas posições da Europa frente a Washington, mas nem sempre pelas mesmas razões. Alguns ameaçam inclusive com criar o seu próprio organismo nacional de gestão da Rede, o que levaria a uma fragmentação desastrosa da Internet.

O desacordo tem uma dimensão geopolítica. Num mundo cada vez mais globalizado, onde a comunicação se transformou em matéria prima estratégica e onde explode a economia do imaterial, as redes de comunicação cumprem uma função fundamental. O controle da Internet outorga ao poder que o exerce uma vantagem estratégica decisiva. Tal como, no século XIX, o controle das vias de navegação planetárias tinha permitido à Inglaterra dominar o mundo.

A hegemonia dos Estados Unidos sobre a Internet confere em teoria aos Estados Unidos o poder de limitar o acesso a todos os lugares da Rede em qualquer país. Pode bloquear todos os envios de mensagens electrónicas do planeta. Até ao momento nunca o fez. Mas tem a possibilidade de fazê-lo. E esta simples eventualidade é motivo de extrema inquietude para muitos países [3]. De modo que chegou o momento de reclamar que a ICANN deixe de depender de Washington e se torne por fim num organismo independente sob a supervisão das Nações Unidas."

RAMONET, Ignacio, "O controle da Internet", Le Monde Diplomatique,Novembro de 2005.

Este artigo encontra-se também em
Informação Alternativa
_____
[1] Ignacio Ramonet,
A nova ordem Internet, Le Monde diplomatique, Janeiro de 2004.
[2]
http://www.icann.org/ e http://www.icannwatch.org/
[3] The Guardian, Londres, 11 de outubro de 2005.

sugerido por cão de guarda