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sábado, novembro 05, 2005

la haine (o ódio)

"Em 1995 o realizador de cinema Mathieu Kassovitz contou-nos a história de Said, Vinz e Hubert, três jovens de uma periferia parisiense que acorda numa manhã em sobressalto devido às torturas sofridas por um jovem de 16 anos num interrogatório policial. A história acaba mal. Agora, morreram dois jovens electrocutados depois de uma acção policial e a pradaria urbana incendiou-se.

Esse belo e trágico filme intitulado O Ódio é uma crónica da permanente guerra civil travada por jovens desintegrados, desempregados e empurrados para a criminalidade com as forças policiais que podia ter sido feita dez anos antes. Ele é apenas mais uma abordagem criativa desta tragédia francesa que antecipa aquilo que um dia pode propagar-se a outros países.


O que está a passar-se em Paris já antes se passou. Paris é um permanente regresso ao passado nesta matéria da violência urbana e também não é por acaso que a França é um dos países europeus onde a extrema-direita fascista maior expressão institucional tem. Há duas décadas que os governos franceses de esquerda e de direita não conseguem dar respostas consequentes na integração das vagas de emigrantes que entraram no país. Há duas décadas que a política francesa oscila entre a defesa e a recusa, ambas radicais, de um modelo social utilizado como arma de arremesso nas barricadas ideológicas de cada tribo. Há duas décadas que a política francesa não sabe como enfrentar o crescimento explosivo do desemprego, da criminalidade, do gigantismo imobiliário em bairros dormitórios, horríveis e labirínticos, que cresceram nas periferias das grandes cidades. Há duas décadas que jovens marginalizados pela crise económica e por uma sociedade em crise de valores estão em guerra com forças policiais abandonadas à sua própria sorte. Uns são a mesma carne do canhão, açulados como cães ao ódio recíproco por um poder político irresponsável(...)" *


"O mesmo sistema de poder que fabrica a pobreza é o que declara guerra sem quartel aos desesperados que gera. Há um século, George Vacher de Lapouge exigia mais guilhotinas para purificar a raça. Este pensador francês, que acreditava que todos os génios são alemães, estava convencido de que só a guilhotina podia corrigir os erros da selecção natural e deter a alarmante proliferação dos ineptos e dos criminosos. «O bom bandido é um bandido morto», dizem, agora, aqueles que exigem uma terapia social de mão pesada(...)

Os problemas sociais reduziram-se a problemas policiais e existe um clamor crescente em favor da pena de morte. É uma pena justa, diz-se, que permite poupar em cadeias, tem um efeito intimidatório e resolve o problema da reincidência suprimindo o possível reincidente. Morrendo, aprende-se a lição.

(…) O poder corta e volta a cortar a erva daninha, mas não pode atacar a raiz sem atentar contra a própria vida. Condena-se o criminoso, mas não a máquina que o fabrica, tal como se condena o toxicodependente mas não o modo de vida que cria a necessidade de consolo químico e a sua ilusão de fuga.

Assim, liberta-se de responsabilidade a ordem social que lança cada vez mais gente para as ruas e para os presídios e que gera cada vez mais desesperança e desespero. A lei é como uma teia de aranha, feita para apanhar moscas e outros pequenos insectos, e não para impedir a passagem dos bichos grandes.

Os delinquentes pobres são os vilões do filme, os delinquentes ricos escrevem o guião e dirigem os actores.”**

* DÂMASO,Eduardo,"O ÓDIO", Diário de Notícias , 4 de Novembro de 2005.
** GALEANO, Eduardo, De pernas para o ar – A escola do mundo às avessas”, Lisboa, Editorial Caminho, 2002,p. 105-106.

sugerido por cão de guarda e por m.ego


1 Comments:

Blogger Roberto Iza Valdés said...

Este comentário foi removido por um gestor do blogue.

11:37 da tarde

 

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